quinta-feira, 21 de fevereiro de 2013

Capitulo 09 - O ANEL DO PESCADOR



Capitulo 09
O ANEL DO PESCADOR

                                                                                                                            
             “Encontrei-me em um país desconhecido. Era um país cheio de casas, mas pelas ruas não havia viva alma. Bati em numerosas portas, mas ninguém abriu... As portas estavam apenas encostadas. Entrei. Em cada casa a mesa estava posta e a lareira acesa, como se os seus donos estivessem para chegar de uma hora para outra... Mas não havia seres vivos nem homens, nem animais.”
                                                                               Teresa Neumann                     
  


O Papa e o chefe da guarda caminharam pelo corredor completamente escuro. O chefe como era um homem sempre rápido em suas ações pegou o celular e conseguiu assim um pouco de luz no caminho.
- Santidade, estou sentindo meus pés encherem de água, parece que estamos descendo para uma poço!
- Não se preocupe Chefe, essa água deve vir de alguma fonte que corre por baixo das catacumbas. Na primeira vez que estive por aqui também fiquei assustado, a entrada do túnel fica num nível acima, logo a agua desaparece.
  


Próximo a realizar a primeira viagem de seu pontificado e que seria para a sua terra natal, o Sumo Pontífice tentou encontrar algo que se parecesse com os desenhos que lhe foram entregues pelo monge Miguel. Antes dessa procura ele teve um contato maior com o seu agora pesquisador, que lhe contou passo a passo, como tinha encontrado aquelas informações. Quis conhecer então com detalhes onde o monge havia deixado o livro e a surpresa foi enorme quando ao voltarem à Biblioteca descobriram que ele havia desaparecido.
Diante do ocorrido o Papa convocou o prefeito da Biblioteca e autorizou o monge a retirar e entregar qualquer obra que ele acreditasse ser importante nas mãos de sua Santidade. Pediu então para o monge que continuasse suas buscas em qualquer localidade. O que ainda eles não sabiam era que existia um arquivo secreto do arquivo secreto dentro do Vaticano.
A procura de algo parecido com um anel já era uma pista importante e o Pontífice então  sem despertar as atenções começou a vasculhar as relíquias que estavam por todos os cantos da cidade. Passou a percorrer todos os lugares e a observar atenciosamente para as todas as obras que estavam em vitrais, em murais, em colunas, etc. Nos aposentos e escritórios começou a prestar atenção em livros, mensagens escondidas, quadros e o logo percebeu que o símbolo da estrela de seis pontas com um centro parecia estar por todas as partes. Começo a observar que numa procura obstinada começa a se ver o que se quer ver por todos os lugares.
Uma das primeiras relíquias que procurou olhar com detalhes foi o Anel do Pescador (Anulus Piscatoris), que durante a cerimonia de Tomada Papal, o Decano do colégio dos Cardeais coloca no quarto dedo da mão direita do Papa e que depois de sua morte ou renuncia é destruído e com o mesmo material é forjado um novo anel para o sucessor. Ele inicialmente era utilizado como um sinete que selava documentos oficiais assinados pelo Pontífice.
O Papa pediu para que o anel fosse retirado do cofre e com ele em suas mãos ficou minutos meditando o que estava além daquelas imagens. O nome escolhido pelo Santo Padre estava gravado na parte superior e ao centro a imagem de São Pedro pescando num barco. Ele sozinho em seu quarto fechou os olhos e tocou no relevo do anel. Um nome, um pescador, uma rede, um barco. Aquele símbolo de hierarquia era provavelmente muito maior do que ele apenas representava. O eterno, o ilimitado.
Abriu os olhos e com isso veio uma ideia em sua mente. Se ele é destruído para ser reconstruído todas as vezes que ocorre uma sucessão, então provavelmente deve existir algum tipo de molde. Quem sabe exista um anel original que tenha dado origem a todos os outros e nele se encontre algo que todos os outros não contenham. De qualquer maneira ele estava comprometido com a viagem para a sua terra natal e isso ocorreria no dia seguinte, portanto a procura sobre o símbolo ainda teria que esperar.
Ao descer do avião ficou impressionado com a recepção em seu país natal, uma multidão incalculável estava a sua espera no aeroporto e o acompanhariam até o mosteiro onde pernoitaria. Durante toda a noite ocorreu uma intensa vigília. Aquilo emocionou o Santo Padre que decidiu após o jantar sair ir à sacada do prédio para saudar os seus semelhantes a quem tanto conhecia.
O Pontífice apareceu no parapeito e levantando as mãos procurou abençoar o seu povo. Ao olhar as milhares de pessoas com velas e voltadas para a sua presença, sentiu uma energia incomensurável. Seu coração se preencheu de um sentimento de imensidão. Foi tomado por um êxtase impressionante. Parecia se sentir um com todos aqueles que o cercava e todos os que o observavam pareciam fazer parte daquele sentimento.
Numa espiral no tempo presente a sensação do Pontífice era a de que algum tipo de portal havia se aberto por um instante em que ele estava tocando de alguma forma o Tempo espiritual. Passado, presente e futuro tinham de alguma forma se fundido num Agora Ilimitado. Esse toque em seu ser fez com que algo se abrisse em sua consciência e esse encontro parecia ter permitido desvelar o porquê daquilo que O Somos o do jeito do Que Somos.
Uma multidão começou a se reunir e gritavam o nome do Papa. Logo o Chefe de Segurança do Pontífice pediu para que ele voltasse para dentro do mosteiro para que não se iniciasse nenhum tipo de tumultuo com a multidão. Ele se despertou daquela sensação espiritual profunda e retornou para os aposentos onde não era visto pelo povo.

O tempo como o conhecemos é uma mera impressão.
Aqueles primeiros dias foram tomados por compromissos com diversas autoridades de seu país natal e muitas honrarias foram feitas ao Santo Padre. Os jovens numa enorme manifestação durante sua caminhada o fizeram recordar dos tempos de sua infância. Sentiu vontade profunda de rever os locais que marcaram sua memoria quando criança. Não sabia o que poderia ser feito, pois agora ele era uma pessoa pública e provavelmente não conseguiria se aproximar de nenhum lugar que não reuniria uma enorme multidão.
Foram dias de profunda emoção por todos os cantos de seu ser e ele chamou o Chefe de sua guarda pessoal para realizar algo que estava fora de sua agenda.
- Gostaria que você me acompanhasse numa aventura chefe.
- Não entendi Santidade.
- Durante minha visita a minha cidade natal que vai acontecer amanha ficarei com minha agenda livre na parte da tarde e gostaria que você me acompanhasse numa visita a casa de alguns amigos.
- Santo Padre em qualquer lugar que o senhor compareça vai haver um grande alvoroço.
- Entendo. Iremos trajados como pessoas comuns e vamos tentar ser o mais discreto possível.
- Se assim o senhor deseja, vou tomar algumas providencias para tornar essa visita o mais segura possível, Santidade. Vou precisar apenas conhecer antes os lugares que vamos visitar.
- Está certo chefe. Já passei os dados para o meu secretário pessoal, o senhor por favor converse com ele e ele lhe mostrará por onde passaremos.
Na noite antes do planejado o Pontífice recebeu como visita um dos seus companheiros de seminário que agora estava comandando. Ele era um homem profundamente culto, sempre se aplicava aos livros e austero consigo mesmo não se permitia nunca ser pelo menos o melhor. Quando o Papa o recebeu e viu aquele seu amigo se curvar para beijar suas mãos, pela primeira vez se sentiu constrangido com aquele ato em si. Preferiu abraça-lo como a um velho amigo.
Aquele era alguém em quem se podia confiar fielmente. Seu conhecimento parecia tê-lo tornado um sábio e algo fez com que o Papa mostrasse o desenho que lhe fora entregue pelo monge Miguel. E sem dúvida alguma disse o seu amigo de seminário:
- O anel de Salomão.
- Como? – perguntou o Papa completamente surpreso com aquela revelação.
- Esse desenho representa claramente o que chamamos de o anel de Salomão. – respondeu o seu amigo calmamente como se tudo aquilo fosse uma coisa simples demais e não ter entendido o porque daquela enorme surpresa pelo Pontífice.
- Meu amigo e o que você sabe mais sobre esse anel?
- Preciso pesquisar melhor, mas pelo que me lembro do anel me parece que sua utilização era para alguma forma de liderança e proteção.
O Santo Padre não se conteve, abraçou firmemente mais uma vez o amigo como se aquele fosse o ultimo abraço de sua vida. O amigo ficou novamente surpreso com tanta euforia. O Papa então expressou o que ele sempre acreditava ser o símbolo:
- E porque não amigo?  Esse símbolo não estaria relacionado a estrela de David?
- Santo Padre, veja como os dois triângulos estão entrelaçados em seus lados, os triângulos da estrela de David estão apenas sobrepostos não é o caso da figura, além do mais esse aro que envolve a estrela parece na verdade ser a face de um anel.
Parecia que uma luz tinha invadido a mente do Pontífice.
- E quanto aos nomes que estão em cada ponta da estrela? – perguntou o Papa entusiasmado com aquelas revelações.
- Bem. – respondeu o amigo agora sem respostas – nesse caso vamos ter que consultar um linguista, as palavras parecem estar em algum formato da língua hebraica.
- De qualquer forma fico imensamente feliz de estar contigo e mais ainda de você ter me ajudado a desvendar alguns mistérios que estou perseguindo nessa minha missão pessoal.
- Mas ao que se referem esses desenhos Santidade. – disse o amigo intrigado com as figuras.
- Ainda não sei amigo, faz parte de um quebra cabeça que estou tentando desvendar. Só sinto que isso vai me levar ao meu destino como líder de nossa Igreja. Mas esse é um outro assunto vamos falar de como está tudo por aqui. Quero matar as saudades que tenho destas minhas origens. – disse o Papa abrindo um enorme sorriso.
No dia seguinte, o Pontífice se vestiu como um comum. Sem os seus trajes papais, tornou-se um cidadão normal no meio da multidão. Estava acompanhado de perto como se fossem apenas dois viajantes do seu chefe da guarda. Um pouco mais de longe alguns seguranças da guarda pessoal acompanhavam os dois.
Era um final de tarde ensolarado e tinham chegado ao lugar desejado num carro comum alugado na cidade. O Papa queria andar normalmente pelos lugares que tanto conhecia, poder falar com as pessoas como um ser do próprio povo. Os seguranças tinham se desesperados com tal ideia, principalmente quando ele resolveu andar pelas ruas movimentadas e acabou parando na praça principal para olhar o movimento.
Se fosse reconhecido por alguém, aquilo iria virar uma verdadeira confusão.
O que o Santo Padre procurava era ver como estavam as pessoas vivendo no seu dia a dia. Viu que a correria tão comum entre os homens agora parecia ter tomado conta não só de suas mentes como também de seus corações. Todos andavam com olhos fixos em seus passos e apenas o que chamava a atenção na maioria das vezes eram apenas as vitrines das lojas. Mendigos eram ignorados e os que queriam falar em praças eram desconsiderados.
Talvez as famílias estivessem em situações diferentes, então resolveu visitar as famílias que tanto conhecia da época em ainda jovem fazia suas visitas paroquiais.
- Por favor, chefe me acompanhe numa outra caminhada.
O chefe da segurança se desesperava todas as vezes em que essas aventuras desprogramadas eram apresentadas.
O Papa então saiu do grande centro voltou ao carro e pediu para que o motorista os levassem para um bairro mais afastado das regiões centrais da cidade. Era um bairro considerado de classe média e quando chegou a porta da residência que ele queria visitar estacionou o carro e pediu para que todos esperassem.
Os seguranças esperaram o Pontífice sair e logo tomaram a postura de quem vigiava, o chefe da guarda desceu do carro e acompanhou o seu vigiado a distancia. Outro segurança atravessou a rua e ficou do outro lado da calçada observando tudo a distancia. O motorista se manteve atento a qualquer ordem e todos se falavam por intercomunicadores. 
Quando o Santo Padre desceu e caminhou na direção da casa de uma das famílias que mais o acolheu durante o seu ministério ele sentiu uma sensação muito estranha parecia ter ido visitar um país desconhecido. As mudanças aparentes eram nítidas, o poder aquisitivo das famílias tinha melhorado profundamente, aquela sensação de criança de uma pequena cidade onde todos se conheciam havia desaparecido. Os vizinhos pareciam todos apesar de casas muito bonitas serem completamente estranhos uns aos outros. Não se via os amigos nas calçadas sentados vendo a noite chegar e juntos rirem muito do dia que estava por se findar.
O Pontífice se aproximou da casa e tocou a campainha. Ninguém apareceu, repetiu o ato e pode ver alguém por trás da cortina observar o visitante e querendo se esconder.
- Sou eu o seminarista amigo da família. – disse de surpresa. – só que depois pensou consigo mesmo, que talvez os seus amigos provavelmente não morassem mais naquele endereço.
A sombra por trás da cortina se dirigiu para a porta de entrada que estava apenas encostada, pois um cachorro estava de vigia no quintal.
- Dona Francisca. – disse o Papa reconhecendo a senhora.
A senhora que aparentava ter idade já bem avançada fixou os olhos para o portão da casa querendo reconhecer aquele homem.
- Sou eu Dona Francisca, o seu seminarista preferido. – disse o Papa brincando com a maneira com que aquela senhora costumava se referir a ele quando ainda era apenas um jovem.
O cachorro correu em direção ao portão latindo desesperadamente.
- Meu filho! – disse a senhora. – ou melhor, Santidade.
A senhora reconheceu o homem pela voz. Correu para pegar a chave e prendeu o cachorro no corredor. Quando ficou pronta correu na direção do portão. Sem pronunciar qualquer palavra não sabia se podia abraçar o Pontífice como fazia quando ele ainda era um seminarista, então preferiu se curvar para pegar a mão do Papa para beijá-la. Aquela situação em plena rua parecia constrangedora para todos, ainda era uma situação que o Santo Padre não conseguia lidar. Esperou então ela terminar o ato e com todo carinho a abraçou como se fosse sua mãe que já não podia mais o acompanhar.
Os dois entraram para a residência, a senhora pediu mil desculpas pela simplicidade sem entender que era isso que o Papa procurava.
- Vivemos outros tempos Santidade.
- Como assim dona Francisca?
- Os filhos de meus filhos não se sentam mais à mesa. O alimento está lá, mas cada um faz seu prato e se retira para cantos diferentes. Vivem em seus quartos trancados e quando a porta está entre aberta ao nos aproximarmos estão apenas concentrados em telas.
- Entendo, o que deveria aproximar acaba distanciando os mais próximos.
- E tem mais, seus pais – os meus filhos -  trabalham vinte e quatro horas por dia a casa está linda, lotada de pertences e  nunca tiveram tanta riqueza só que ela está completamente vazia de gente que também está se esvaziando por dentro.
- Não olhar para uma dimensão maior do que aquela que apenas experimentamos em nosso dia a dia nos faz morrer pouco a pouco. Vivemos mas não nos mantemos vivos se não procuramos nos conectar com algo ainda maior que nós mesmos.
A conversa demorou por um bom tempo até que o Pontífice foi avisado pelo chefe da guarda que tocou a campainha informando que eles precisavam voltar urgentemente. A viagem chegou ao seu fim depois de alguns dias e o Papa depois de cumprir toda a sua agenda retornou ao Vaticano preparado para dar continuidade a sua missão pessoal.


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