Capitulo 19
O Piedoso
O dia do Senhor virá como um ladrão. Os céus acabarão com grande
estrondo, os elementos em chamas de dissolverão, e a terra será conhecida em
suas obras. Pois, se tudo vai desintegrar-se desta maneira, não deveis
perseverar em vossa santa conduta e em vossa piedade, esperando ansiosamente a
chegada do dia de Deus, quando os céus em fogo se dissolverem e os elementos em
chamas derreterem?
São
Pedro, Apóstolo.
Naquele
mesmo instante o semblante do chefe da guarda brilhou. O fascínio do dourado da
pedra não brilhava apenas os rostos e sim toda a sala mostrando uma luz
resplandecente. O Santo Padre então aguardou acontecer o que já conhecia. O centro
da sala sem a pedra de mármore que na verdade era uma espécie de tampa, se ergueria
automaticamente e a relíquia se apresentaria como se estivesse desabrochando.
A
pedra tinha o tamanho de um ovo de avestruz, lapidada de forma hexagonal se
encaixava numa espécie de casa e quando o Papa a retirou o Chefe da Guarda
percebeu que ela possuía três faixas desenhadas em formato de xis que
transpassavam dos dois lados da joia.
Mais
uma vez o Pontífice surpreendeu e retirou de seu habituario um saco de feltro e
envolveu o que ele denominava de o “Grande Sétimo”.
Os países
estavam entrando em período de profundo conflito. Tempos críticos se alastravam
por todos os cantos do mundo. A riqueza superficial estava sendo corroída em
sua essência corrompida. A busca de se unir o globo num grande mercado foi
esvaziada pelos embates do próprio sistema. Homens ensandecidos começaram a
tomar o poder de suas nações e as terras pareciam querer implodir. A natureza
parecia acompanhar o humor humano e vivia tempos escabrosos. Tempestades,
furacões, terremotos, estiagens tornaram-se eventos corriqueiros. O Santo Padre
diante dessas tantas dificuldades estava sendo chamado a todo instante para
acalmar os conflitos e principalmente apascentar os seus fiéis espalhados pela
superfície da Terra.
Foram nesses
dias que o Sumo Pontífice enfrentou uma grande perda para o seu Pontificado, o
velho bispo aquele que tanto o aconselhou e que depois ficou sabendo ser o
responsável direto por sua eleição como Papa estava no leito de morte à espera
da benção dele. O Papa então mesmo na tribulação conseguiu uma maneira de ir ao
encontro daquele que se tornara um de seus confidentes espirituais.
O que é a
morte se não um recomeço diante da verdadeira Vida?
A
dificuldade de locomoção para o Papa era uma das coisas que mais o incomodava.
Recordava-se de quando podia sair discretamente em visita a seus amigos e
parentes em qualquer lugar. Isso porque para uma visita a um amigo que estava
num leito do hospital precisava-se de um aparato digno de uma visita oficial de
Estado.
Ao ver
aquele homem coberto por um lençol branco deitado como se nunca mais pudesse se
levantar, com o rosto em flagelos como em uma pintura abstrata e respirando
apenas o ar distante de sua existência humana o Santo Padre encheu-se de
misericórdia por todos os seres existentes. Aproximou-se lentamente e pegando
nas mãos do Bispo inundou seus olhos de lágrimas e seu coração de compaixão.
O bispo
percebeu a presença daquele homem que sempre mantinha-se em tranquilidade ao redor
de todos e procurou devolver seus olhos
que já estavam em outro mundo a este. Apertando as mãos do Santo Padre como
quando se segura um inestimável pertence o velho homem sussurrou algo
incompreensível.
O Santo
Padre sempre generoso percebendo a dificuldade de seu Bispo baixou a sua cabeça
e pôs seus ouvidos próximos da boca do enfermo para que ele repetisse aquele
murmúrio.
- Me perdoe
Santidade. – suplicou o velho Bispo com todos os esforços possíveis.
O Papa então
imaginando que seu conselheiro estivesse pedindo uma unção para sua passagem
nesta vida e assim ergueu sua mão direita e abençoou o enfermo o liberando de
todos os seus pecados. Surpreendentemente o Bispo novamente sussurrou outras
palavras e o Santo Padre novamente aproximou seu rosto do velho homem.
- Pequei
contra Vossa Santidade. – sussurrou o Bispo já tentando erguer sua cabeça para
ser melhor compreendido.
- Vossos
pescados estão perdoados meu velho amigo. – respondeu o Papa levando seus
lábios aos ouvidos do Bispo.
- Tu és
realmente o Piedoso, sua bondade o fez sentar-se ao Trono de Pedro. – começou a
falar lentamente o Bispo nos ouvidos do Papa
O Santo
Sacerdote lembrou-se então das palavras de São Pedro em sua Epístola, Capítulo
03, 10-13 e as pronunciou ao Bispo:
“O dia do
Senhor virá como um ladrão. Os céus acabarão com grande estrondo, os elementos
em chamas se dissolverão, e a terra será conhecida em suas obras. Pois, se tudo
vai desintegrar-se desta maneira, não deveis perseverar em vossa santa conduta
e em vossa piedade...?”
Perdoe-me de
todo o vosso coração porque o traí. – disse o Bispo tentando virar o rosto e
olhar aos olhos do Papa que agora sim procurou entender o que seu conselheiro
estava querendo lhe dizer.
- Eles
queriam manipular o vosso Pontificado e de certa forma eu os ajudei. Acreditávamos
que porque estava sempre sorrindo seria um fraco diante das primeiras
dificuldades que enfrentasse e assim tomariam o poder da igreja facilmente
estando em vossas mãos.
- Quem são
eles, conselheiro? – perguntou o Papa agora olhando diretamente ao rosto do
Bispo.
- Por favor,
Santidade – sussurrou o bispo como se fossem as suas últimas palavras – perdoe-me
por ter traído a vossa confiança. –
- Que Deus
perdoe os vossos pecados meu amigo e conselheiro. – anunciou o Papa olhando
para os olhos do bispo marejados de lágrimas que correram por seu rosto, que
sentindo a mão daquele homem apertar a sua como num grande abraço.
Foram as últimas
palavras de seu conselheiro, aqueles olhos safirizados tinham encerrado sua
visão deste mundo. O Papa sabia que podia confiar em poucas pessoas, só que
aquele seu companheiro de quem pediu tantos conselhos e a quem confidenciou
muitas de suas dúvidas era um dos poucos em que ele acreditava poder confiar.
O chefe da
guarda que estava na porta do quarto correu para chamar as enfermeiras que
estavam no corredor de plantão. Realmente já era tarde. O bispo tinha se
retirado de nosso mundo físico em busca do perdão a si mesmo pela eternidade.
Quanto ao
Sumo Pontífice parecia ter tomado um golpe em suas próprias costas e o pior de
tudo sairia daquele hospital sem respostas sobre quem seriam seus verdadeiros
opositores. Com esses anos de pontificado já podia apontar para alguns daqueles
que estariam tentando de alguma forma manipulá-lo. Entendia que as duas
correntes, os Spiritualis e os Iluminatis estavam se degladiando e cedo ou
tarde iriam expor suas feridas O que realmente o preocupava era que
provavelmente algum tipo de força externa ao Vaticano pudesse estar comandando
alguma das duas correntes.
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